A verdadeira Igreja de Cristo não é uma fábrica de milagres

Padre Lucas Altmayer, 25/01/2025 11:42

No último domingo, ouvimos o maravilhoso milagre da transformação da água em vinho, nas bodas de Caná. O Evangelho de hoje, neste III Domingo depois da Epifania, relata dois outros magníficos milagres: a cura de um leproso e a cura do empregado do centurião. Devemos falar sobre os milagres.

No sagrado mistério da nossa fé, muitas vezes somos tentados a olhar para os milagres como a razão da existência da Igreja. O mundo atual, sedento de sinais imediatos, procura constantemente por manifestações extraordinárias. Mas, é necessário que, com olhos atentos à verdade divina, entendamos que os milagres, embora maravilhosos e poderosos, não são a finalidade da Igreja Católica.

A Igreja não foi estabelecida para ser uma fábrica de prodígios, onde cada fiel viesse em busca de uma cura física ou de um bem material. Os milagres, como sinais de credibilidade, são o que eles são: sinais. Eles nos apontam para algo muito mais profundo do que a nossa satisfação pessoal ou as nossas necessidades temporais.

1. Os milagres são sinais, não a finalidade da Igreja

Recordemos, meus caros, que os milagres que Cristo operou durante Sua vida terrena tinham um propósito claro: testemunhar a chegada do Reino de Deus, servindo como sinais de credibilidade para Nosso Senhor Jesus Cristo. A multiplicação dos pães não visava satisfazer a fome material dos homens, mas mostrar que Jesus é o pão da vida, o único que pode saciar a fome eterna. Jesus andou sobre as águas depois de ter multiplicado os pães para manifestar que Ele pode estar onde Ele quiser e que sua presença se estende até onde Ele quiser. É a prefiguração da Eucaristia: Jesus está realmente presente nos acidentes do pão e do vinho. A cura dos enfermos não era apenas para devolver a saúde física, mas para manifestar que Cristo é a fonte de toda cura, especialmente da doença espiritual do pecado.

De maneira semelhante, a Igreja, em sua missão terrena, não é chamada a operar milagres como fim último. O fim da Igreja é a salvação das almas, a edificação do Corpo de Cristo, que é a nossa união com Ele através dos sacramentos, da oração e da caridade. Os milagres são, portanto, como que o brilho efêmero que nos lembra da eternidade, mas nunca devem ser confundidos com a finalidade da Igreja. A Igreja existe para pregar o Evangelho, para ensinar a Palavra de Deus e, acima de tudo, para conduzir cada um de nós ao encontro com a verdade e a vida em Cristo.

2. A Teologia da Prosperidade: Um erro que nos desvia da verdadeira missão

Infelizmente, em nosso tempo, há aqueles que, distorcendo o Evangelho, tentam nos convencer de que a fé cristã se resume à busca de bens materiais e de prosperidade. A chamada "teologia da prosperidade" nos diz que a riqueza e o sucesso são sinais de que estamos no caminho certo, e que a fé verdadeira leva à saúde perfeita, à riqueza material e à felicidade instantânea. Este é um erro grave, caríssimos.

Jesus, nosso Mestre e Senhor, não nos prometeu riquezas temporais. Ao contrário, Ele nos alertou: "Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração" (Mt 6,21). A verdadeira prosperidade que a Igreja oferece não está nas riquezas deste mundo, mas na riqueza eterna do Reino dos Céus. Como o próprio Cristo nos ensinou, "meu reino não é deste mundo" (Jo 18,36). A verdadeira vocação da Igreja é conduzir o fiel à prática do amor de Deus, à prática da virtude e à busca da santidade.

Portanto, é uma distorção da verdadeira fé ensinar que a Igreja é um meio para alcançar prosperidade material. Não estamos aqui para sermos ricos em bens temporais, mas para sermos ricos em graça e virtude. Nosso tesouro é o Reino de Deus, e é nele que devemos buscar nossa felicidade e paz duradoura.

Este erro é chamado de ‘teologia da prosperidade’, e é um inimigo externo da verdadeira fé, praticado pelos protestantes. Entretanto, este erro respinga nos fiéis católicos, uma vez que ele adentrou na Santa Igreja por causa de movimentos fundados com base no protestantismo.

 Assim como a Igreja não existe para o sucesso material, ela também não foi fundada para os milagres sensíveis. 

A ênfase no sobrenatural e nas manifestações visíveis do Espírito Santo, como curas e experiências emocionais intensas, pode levar a uma busca por sinais e prodígios como prova da presença de Deus. Quando isso se torna o objetivo central da fé, os fiéis podem passar a se concentrar mais em como se sentem ou em eventos miraculosos do que no crescimento espiritual, na vivência do amor de Deus, no compromisso com o Evangelho e na prática das virtudes cristãs.

Quando os milagres e as conquistas se tornam o centro da experiência religiosa, corre-se o risco de criar uma espiritualidade utilitarista, onde Deus é visto como alguém que deve atender às nossas necessidades ou desejos de forma instantânea. Isso pode gerar desilusão e frustração nos fiéis quando os milagres não acontecem como esperado, levando a uma fé superficial ou até ao afastamento da Igreja.

O movimento carismático, por exemplo, pode ser acusado de promover uma espiritualidade emocionalista, onde o foco está na experiência subjetiva e sensível de Deus. Embora emoções sejam uma parte legítima da vida espiritual, se a fé depender unicamente de sentimentos ou de experiências extraordinárias, isso pode enfraquecer a relação com Deus, tornando-a volúvel e instável, dependendo das circunstâncias ou dos estados emocionais da pessoa.

A ênfase nas manifestações sensíveis pode desviar a atenção das dimensões mais simples e cotidianas da fé, como a oração constante, o perdão, a caridade e a busca pela santidade nas pequenas coisas da vida. Isso pode gerar uma distorção de que a verdadeira espiritualidade se encontra apenas nas grandes experiências extraordinárias, em vez de ser vivida no dia a dia.

Sem discernimento, a ênfase nas manifestações externas pode levar a uma imaturidade espiritual. Nem todas as manifestações que se dizem sobrenaturais vêm de Deus, e a Igreja ensina que é importante discernir se as experiências são verdadeiramente do Espírito Santo ou se podem ser fruto de outros fatores. Um foco exagerado nessas manifestações pode enfraquecer a capacidade dos fiéis de discernir a verdadeira ação de Deus em suas vidas.

Quando a ênfase está em milagres e sucessos, pode-se correr o risco de ignorar a realidade do sofrimento e da cruz, que também fazem parte da experiência cristã. A fé não se resume apenas a vitórias e realizações, mas também ao apoio que Deus oferece nos momentos de dificuldade, sofrimento e provação. Focar apenas em vitórias pode obscurecer a importância do sofrimento redentor e da perseverança na fé.

3. A Igreja é o caminho da salvação, não da busca por milagres efêmeros

Meus caros, a Igreja, como Corpo de Cristo, foi fundada para ser a coluna e o fundamento da verdade (1 Tm 3,15). Ela nos transmite a Palavra de Deus, nos oferece os sacramentos, e, pela graça divina, nos leva a uma vida de santidade e comunhão com Deus. Os milagres podem acontecer, sim, como expressão da misericórdia de Deus, mas não devemos viver em busca deles.

Se Deus, em Sua infinita bondade, realiza milagres em meio ao Seu povo, é sempre para fortalecer a nossa fé, não para desviar nossa atenção da verdadeira missão da Igreja. O fim último de nossa existência não é a busca de uma vida sem dificuldades, mas a preparação para a vida eterna. Devemos caminhar na fé, no amor e na esperança, não esperando que a Igreja seja um local onde todos os nossos desejos materiais sejam atendidos.

Portanto, caríssimos, que possamos olhar para os milagres com os olhos da fé, sem nos deixarmos seduzir pela ideia de que eles são a razão de nossa existência cristã. Que a Igreja nos ajude a compreender que a verdadeira prosperidade não é material, mas espiritual, e que a nossa missão é buscar o Reino de Deus, onde a verdadeira paz e felicidade nos aguardam.

Que Maria, Mãe da Igreja, nos acompanhe e nos conduza no caminho da fé verdadeira, aquele que não se prende aos milagres efêmeros, mas se dirige com confiança ao Senhor, fonte de toda graça e salvação.