Padre Lucas Altmayer, 23/08/2025 16:47
Queridos amigos,
Ouvimos hoje dos lábios do próprio Salvador uma advertência que, se levada a sério, é suficiente para abalar toda falsa segurança espiritual: “Se a vossa justiça não for maior do que a dos escribas e fariseus, não entrareis no Reino dos Céus”.
Estas não são palavras brandas. Jesus não diz que seremos menos santos, menos felizes, menos perfeitos... Ele diz que não entraremos no Reino dos Céus se nossa justiça for igual à dos fariseus.
A justiça dos fariseus era externa, fria e legalista. Eles observavam a Lei apenas na aparência, cumpriam os preceitos e julgavam-se justos por causa disso. Mas o coração estava longe de Deus (cf. Mt 15,8).
Tinham zelo, mas não por amor. Guardavam a letra, mas não o espírito.
A verdadeira justiça cristã não é apenas fidelidade à letra, mas adesão total a Cristo. Como dizia São Paulo: “Não tendo minha justiça que vem da Lei, mas a que vem pela fé em Cristo” (Fl 3,9). Ela não teme, se for o caso, a ir contra a letra, desde que vá sempre segundo o espírito da lei: nos fazer honrar a Deus, amá-lo sobre todas as coisas e amar ao próximo como a nós mesmos. Ela sabe, nos dizeres de São Paulo, que “a letra mata, mas o espírito vivifica”.
O fariseu é aquele que se esconde atrás da letra da lei, como quem se esconde atrás de uma máscara. Faz tudo o que está escrito, observa todos os costumes religiosos, ensina que a comunhão e a unidade da Igreja são o dogma por excelência do católico, mesmo que a lei, as práticas e os costumes contradigam a fé transmitida integralmente ao longo dos séculos. Jamais questiona se aquilo que faz é conforme à glória de Deus ou ao bem do próximo. Ele cumpre, mas sem amar. Obedece, mesmo que aquilo diminua o amor a Deus. Executa, mas sem se importar se a caridade está acima de tudo.
O católico verdadeiro, ao contrário, ama a Lei de Deus — mas não como um código frio, e sim como uma expressão da vontade do Pai. Ele sabe que há uma letra, que não pode ser desprezada, mas também sabe que há um espírito. E se, porventura, em alguma situação excepcional, a letra parecer contrariar o amor a Deus ou a honra de Sua glória, o católico não teme seguir o espírito da Lei, mesmo que para isso precise contrariar os homens, contrariar os costumes, contrariar as disposições canônicas.
O fariseu moderno idolatra a Lei, mas diminui a honra do Deus que a deu. Ele faz da norma um fim em si mesmo, e não um caminho para a santidade. Lembremo-nos: os fariseus crucificaram Jesus em nome da Lei.
O católico adora o Legislador. Ele vê na Lei um reflexo da sabedoria divina, e procura nela não apenas regras, mas a vontade viva de Deus. E por isso, quando precisa escolher entre a letra e a caridade, ele escolhe Deus.
Foi o que fez Nosso Senhor no sábado, ao curar o homem da mão seca. Os fariseus se escandalizaram: “É permitido curar no sábado?” Jesus os responde: “O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado.” (Mc 2, 27).
Foi assim que São Paulo resistiu a São Pedro na questão da circuncisão: não por orgulho, mas porque compreendeu que a letra da Lei antiga não podia mais ser imposta aos gentios, pois Cristo já havia trazido a plenitude da Lei.
Se quisermos entrar no Reino dos céus, nossa justiça deve ultrapassar a justiça dos fariseus. Só existe uma maneira de superar a justiça farisaica, meus amigos: com a caridade cristã, é o que acabamos de dizer.
Para terminar, gostaria de deixar um conselho prático, para a prática da caridade fraterna. Lembremo-nos: a justiça de Deus não é apenas legal, é misericordiosa. E é aí que o cristão verdadeiro ultrapassa o fariseu.
São Pedro, na epístola que ouvimos, escreve aos cristãos perseguidos:
“Não pagueis o mal com o mal, nem injúria com injúria. Ao contrário, bendizei, pois para isto fostes chamados.” (1Pd 3,9)
Isso, meus irmãos, é o coração da santidade cristã: recusar-se a devolver na mesma moeda. Não basta não odiar: é preciso amar quem nos ofende. Não basta não se vingar: é preciso rezar por quem nos calunia. Não basta suportar o mal: é preciso transformá-lo em ocasião de bem.
A nossa justiça deve ser superior à dos fariseus porque ela brota de um amor que imita o Coração de Cristo. O mundo ensina: “faça o outro provar do próprio veneno.”
Cristo ensina: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.” O mundo grita: “olho por olho!” Cristo responde: “se alguém te bater numa face, oferece-lhe também a outra.” O mundo condena. Cristo redime.
Por isso, o verdadeiro cristão não revida, não murmura, não se vinga. Sua força está em sua mansidão, e sua coragem, na fidelidade ao bem.
É natural ao coração humano o impulso de reagir, de se defender, de responder ao mal com o mal, ao orgulho com orgulho, à palavra áspera com uma ainda mais dura. Mas o Evangelho de Nosso Senhor nos ensina o contrário. Diz o apóstolo São Paulo: "Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem" (Rm 12,21).
Quantas vezes, dentro de um lar, nasce um pequeno desentendimento… uma palavra mal colocada… um olhar de impaciência… um esquecimento… E o que faz o outro? Responde com frieza, com silêncio, com indiferença… De repente, aquilo que era um pequeno tropeço, vira uma muralha, um abismo.
Quantos casamentos se desgastam não pelos grandes pecados, mas pelas pequenas guerras diárias! Pequenas mágoas guardadas, pequenos trocos dados com gosto… Até que, um dia, o amor parece ter esfriado. Não porque acabou, mas porque foi sufocado pelo peso de tantas pequenas vinganças.
Mas olhemos para o exemplo do nosso Divino Salvador. Quando foi ofendido, caluniado, traído… Ele não respondeu na mesma moeda. Na Cruz, pregou a maior lição de amor da história, dizendo: "Pai, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lc 23,34).
Se Cristo amou assim… se Ele perdoou assim… como cristãos, somos chamados a imitá-Lo.
Quando vier a vontade de retrucar, calem-se por amor. Quando vier o desejo de dar o troco, retribuam com um gesto de carinho inesperado. Quando o orgulho quiser dominar, lembrem-se: "O amor tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta" (1Cor 13,7).
Caros fiéis, examinemo-nos. Não sejamos juízes de outros, mas juízes de nós mesmos. A pergunta não é: “Conheço algum fariseu?”, mas: “Não haverá em mim algo de fariseu?”
Que Maria Santíssima, humílima escrava do Senhor, nos livre do orgulho espiritual e nos ensine a viver com autenticidade, verdade e amor. E que a nossa justiça, unida à de Cristo, nos leve à glória do Reino dos Céus. Amém.